Voltar ao topo

Artigos Cecília

Desejos

Desejo a você
Fruto do mato 
Cheiro de jardim
Namoro no portão
Domingo sem chuva
Segunda sem mau humor 
Sábado com seu amor (...)
“Desejos” Drummond

Todos temos muitos desejos, sendo que se pararmos para pensar sobre alguns deles, os sentimos quase como sendo um compromisso. Com o verso inicial de Drummond estou incentivando os leitores a desejar algumas coisas porque me parece que as pessoas estão desistindo facilmente dos seus desejos. Ainda mais preocupante, me parece que os jovens de hoje “desejam pequeno”, ou vivem em tédio.     Vamos por parte. Tentemos primeiro entender o que são os desejos.

Alguns autores falam que os desejos surgem de nossa natureza humana e seriam o que nos distingue dos animais. Nos textos, os desejos, com freqüência, são classificados como algo “mal”; uma coisa ruim, que nos atrapalha o raciocínio e que se a gente se deixar levar por eles poderemos fazer coisas escusas ou de maldade, como se o desejo vem do lado dos impulsos maus. 

Uma outra crítica que se ouve com freqüência é que, sendo a pessoa um conjunto de desejos, sentimentos, pensamentos e ação, os desejos seriam o componente que “atrapalha” os outros elementos dos seres humanos e que de alguma forma seriam mais evoluídos.

Gosto de pensar que o desejo não conhece a diferença entre o bem o mal; que ele é a nossa condição humana universal; que nos separa e nos distingue dos animais; que é algo original. Não é necessário pensar para ter desejo.

Quando perguntaram a Rubem Alves sobre o que nos distingue dos animais, ele fez uma colocação interessante, afirmando que nossos corpos são diferentes e que os animais não sentem, e que só sentem aquilo que diretamente atinge a sua pele.

Aparentemente com essas lindas afirmações fica difícil entender porque as pessoas na atualidade não desejem ou desistam de seus desejos. Talvez o problema está nas pessoas é não nos desejos. Para poder desejar precisamos nos conhecer, e isso talvez seja uma dificuldade do mundo moderno. Precisamos de tempo para isso.
Semear, cultivar e alimentar o desejo leva tempo (um tempo insuportavelmente prolongado para os padrões de uma cultura que tem pavor em postergar, preferindo a “satisfação instantânea”). O desejo precisa de tempo para germinar, crescer e amadurecer. E o tempo necessário para o investimento no cultivo do desejo dar lucros parece cada vez mais longo, irritante e insustentavelmente longo numa época em que tudo é velocidade.

Gostaria de finalizar esta reflexão compartilhando com vocês uma afirmação tão antiga que é anterior ao nosso Deus. Os gregos já sabiam a importância do que estamos conversando, tanto, que na entrada do Oráculo de Delfos (dedicado ao Deus Apolo) estava o dizer: “Conhece-te a ti mesmo”.

Cecília Urbina, psicóloga.
CRP/12-0957 Membro fundadora da CERES (Associação Criciumense de apoio a saúde mental)