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Poder e Livre Arbítrio

Há dois séculos que nossa origem não determina nosso destino. Não seguiremos uma profissão só porque esse foi o oficio de nosso pai e avô. Não nos casaremos por tradição, nem segundo a escolha das famílias. Escolheremos sempre por gosto ou por amor. Ou seja, temos a incrível pretensão de viver segundo nosso desejo e realizar-nos segundo o livre-arbítrio.

Mas o livre arbítrio é complicado. Ele nos complica. As pessoas se queixam de ter livre arbítrio. Por quê? 

Neste mundo sem castas fechadas, com poucas fronteiras, com o todo ao nosso alcance, as possibilidades são muitas e, talvez por isso mesmo, os desejos que nos animam são ilimitados.

Com o livre arbítrio a responsabilidade dos nossos desejos fica para cada um de nós.

Devemos arcar com as conseqüências e escolher. Como o escolher implica perdas (não podemos fazer tudo o que queremos), os desejos se convertem provavelmente numa das principais causas da angústia do homem moderno.

Qualquer um pode romper com tudo e fazer só o que quiser. Se não o faz, de fato, é exclusivamente porque as conseqüências podem ser muito danosas e graves. 

Apesar do livre arbítrio, existe ainda o controle social. Nossas escolhas tem um certo controle mas ele é diferente de antigamente. Antes o controle era institucional, regido pelas leis (do homem ou religiosas). E atualmente o controle é moral, exercido pelos costumes. Há muitas coisas que podemos fazer, mas não devemos? E por isso deixamos de fazer.   Neste caso, a confiança é fundamental, porque quanto maior a confiança entre as pessoas, ou entre as instituições, menor a necessidade de controle.

Residindo na nossa cidade, onde pelo seu tamanho e pelo tipo de relações se tem um controle social maior, o peso do dever determina as pessoas um aspecto menor de possibilidades de escolhas nos seus desejos. Por exemplo, teoricamente há menor incidência de traições conjugais, por ter um controle social maior.

O desejo, na psicologia, está ligado ao prazer. O prazer pode ser considerado desnecessário para a manutenção da vida. Contudo, se não fosse pelo desejo de termos prazeres, segundo o autor Eugenio Mussak, não teríamos evoluído, porque teríamos a caverna para nos abrigar da chuva, raízes e carne crua para comer. A partir do momento em que começamos a produzir prazeres em forma de arte – música, poesia, literatura - evoluímos. 

Ter desejos, sim, é uma necessidade. Realizá-los pode não ser, mas ninguém consegue viver sem desejos. A inteligência de cada um deve definir, de acordo com seus objetivos, o que é essencial, importante ou incidental. Se aquele desejo é essencial ou não, se antes disso a pessoa prefere atender a suas necessidades básicas ou não.

Resumindo, é necessário maturidade para administrar os desejos e fazer as escolhas certas.

Cecília Urbina, psicóloga, CRP/12-0957 Membro fundadora da CERES (Associação Criciumense de apoio a saúde mental).

Bauman, Zygmunt Amor Liquido.Rio de Janeiro: Jorge Zahar Ed., 2004
Calligaris, Contardo. Volta da Flip, 14/07/2011, Ilustrada E11. Folha de São Paulo.
Marins, E. e Mussak, L. Motivação. Papirus 7 mares.
 Botelho, Razão e instinto. Em Vida Simples. Edição 93, 2010
Yalom. Irvin D. A cura de Schopenauer.