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Luta e Perda

Luto e Perda

Conta a historia que uma mulher viúva perdeu seu único filho. Lamentou muito, e se sentiu perdida e com a vida sem sentido - pois ela gastava todo seu amor e energia cuidando do filho -  procurou um dia, um velho sábio.

Ele disse:  “Vá até a cidade, encontre algumas sementes de mostarda, e entrega-as para mim. Mas há uma condição: só servirão as sementes de casas onde ninguém tenha morrido”.

A mulher saiu batendo de casa em casa e ouvia sempre a mesma história: “Podemos lhe dar quantas sementes quiser, mas a condição não será cumprida, pois muitas pessoas já morreram em nossa família – um avô, um tio, um filho”...

Mas ela insistia. Ainda com esperança, continuava sua busca. Perambulou vários dias.

Até que, numa noite, teve uma grande compreensão: a morte faz parte da vida, acontece com todas as pessoas e não é algo pessoal que acontece só com ela. Não há vida sem morte, nem morte sem vida.

Com essa descoberta, voltou ao velho sábio:  “Então, onde estão as sementes”?, perguntou ele.

Ela sorriu, e caiu a seus pés dizendo:  “Mestre, entendi sua lição. Agora estou pronta para conhecer aquilo que nunca morre. Não peço mais pela minha criança de volta, pois mesmo que me seja dada de volta, morrerá novamente um dia. Ensina-me algo, de tal modo que agora eu possa conhecer, dentro de mim mesma, aquilo que nunca morre”.

A viúva ainda descobriu que, colocar seu filho em sua memória, lembrando de todos os detalhes de sua vida, o manteria vivo... ausência se fazendo presença. Se o esquecesse, aí, sim, ele morreria!

Mais calma, suportou a dor pela perda, e entendendo que, se paralisasse, teria uma morte em vida, seguiu em frente, criando novos projetos para sua existência.

A morte pode ser vista como um mistério incompreensível. Ou como um absurdo inaceitável. A morte pode até ser tratada como tabu, assunto do qual a maioria das pessoas não gosta de falar. Mas, seja como for, aceitemos isso ou não, a morte é um fato, e ela faz parte da nossa vida. 

A perda de uma pessoa querida é uma das experiências dolorosas mais intensas que qualquer ser humano pode sofrer, e não é só dolorosa como vivência, mas também dolorosa de ser testemunhada .  A dor é inevitável mas é um processo natural. 

Como é algo que não se pode evitar e nos faz sofrer o homem moderno tentou evitar a percepção da morte.  Tornamos distante a morte. O mundo moderno modificou os rituais da morte. Antes os rituais ajudavam a consolidar a percepção de não poder ter mais contato com a pessoa morta. Era um espaço para ritualizar o processo de passagem. No velório e enterro a pessoa enlutada concretiza o fato da morte, para poder entender cognitivamente a perda e depois no seu “coração” poder elaborar. 

Não se deixa vivenciar o luto porque o mundo moderno nega as emoções tristes e ainda não permite as pessoas parar e ter seu ritmo de vida modificado.  O luto interrompe a experiência do tempo. A pessoa tem a sensação de que o mundo segue e ela fica parado. A ideia é que o “eu” criado na relação fica parado, deve aceitar-se a perda da pessoa que ajudou a construir o seu eu. Tem que reinventar-te como pessoa que tem essa relação, mas não mais concreta e sim espiritual  E isso como todo processo psicológico leva tempo .

Para isso servem os rituais, para ajudar nesse processo e para que depois de um período o enlutado passe a atender a situação e no seu dia-a-dia volte a dar sentido a vida

Concluindo cada pessoa vive a situação de luto de maneira diferente. Ao mesmo tempo é diferente e interdependente.  O luto é um processo natural e normal mas ele gera sofrimento e precisa de atenção, quando impossibilita o desenvolvimento ou crescimento dos envolvidos ou o faz vulneráveis. Sobre esses casos de lutos difíceis vou falar num outro artigo.

Cecília Urbina, Psicóloga CRP 12/00957